sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Concentração em fuga

Às 21:04 em ponto aperto o mosquito que está sobre a mesa contra a capa do meu caderno.

Foi sem querer, eu juro! Jamais escolheira matar um mosquito assim: na minha mesa, com a capa do meu caderno bonito e novo. Meu caderno homenageia o pequeno príncipe, oras! Eu não insultaria o pequeno príncipe por tão pouco....

Mas ele era tão frágil e pequeno que o meu caderno, embora fosse, nem precisava ser de ´capa dura`.

"Morreu", pensei baixinho.

E foi isso.

Ele morreu no auge da minha concentração, levando consigo um pedação dela.

Pensei no epitáfio. "Aqui jaz um mosquito acadêmico".

Fitei os olhos mais uma vez no pequeno cadáver para depois devolvê-los ao texto que estava em minha frente e esboçava um leve ciúme.

Não consegui me desfazer do corpinho do mosquito.
E comecei a alternar: olhos nas letras, olhos no mosquito. Olhos nas letras, olhos no mosquito. Olhos nas letras, olhos no mosquito. Até que, para tristeza do meu companheiro texto, o mosquito esboçou um pequeno movimento.

Meio lento, parecia bêbado. Começou a se arrastar sobre o vasto-mundo-Raimundo, que naquele contexto era só uma mesa verde de biblioteca.

Para mim, era a própria ressurreição do mosquito. Da morte para a vida.

Meu coração ficou dividido.E minha fidelidade infiel não me deixava deixar o texto. Muito menos o pequeno mosquito.

E comecei que olha daqui, lê ali. Lê ali, olha aqui.

...Lakatos, mosquitos. Investigação-ação, mosquito. Habermas, mosquito. Dialética, mosquito. Ciências, mosquito.
E depois...
...Asas, texto. Patinhas, texto. Voar, texto. Vida em miniatura, texto. Fragilidades, texto. Morte, texto.Ressurreição, reencarnação, religião, ideologia, ciência...

Putz, ciências!!

Já são quase 21:40 e eu não mudei de página. E pra piorar: esqueci o que dizia o que eu estava lendo.

Pra piorar de novo: vou precisar esperar a ressurreição da minha concentração...a passos lentos e meio bêbados.



....porque ela é assim...dura não mais que o tempo que tem de fugir de mim. É delicada, como um mosquito de biblioteca. E frequentemente se faz moribunda frente a capa do meu caderno.

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