Há muito não ficava assim: sem trabalhar e com a obrigação do repouso. O repouso por obrigação, de início, parece enlouquecedor. E depois ele vai acordando o que a gente deixa adormecer no dia-a-dia do dia-a-dia. É o dia-a-dia que é, na verdade, enlouquecedor. E isso pode parecer clichê, mas eu juro que só me dei conta agora.
É porque tem vários tipos de se dar conta. Tem o se dar conta no pensamento, o se dar conta no corpo, o se dar conta na alma, o se dar conta da boca pra fora.... O se dar conta holístico tem também, e é esse que me ocorre agora. Na alma, no corpo, na mente, na boca pra fora e pra dentro, depois de dias deitada, toda instância de eu possível percebeu que um atestado médico usado com louvor pode ser mágico. Eu falo "com louvor" porque aquele atestado médico que te permite sair de casa e dar um rolé, beber, fumar e namorar, pode ter seus mil encantos, mas não funciona como um retiro.
Enfim...hoje me sinto no pós-retiro. Voltei a trabalhar e já até estou desfilando minhas bochechas gordinhas por aí, levemente esverdeadas, diga-se de passagem. Eu que já ando com a pele amarelada por execesso de sucos de cenoura-beterraba-e-alguma-coisa-diferente-da-geladeira, tenho o diferencial de desfilar uma face verde-amarelada por aí esses dias. Se você tiver sorte e me encontrar, vai ver que coisa linda. Quase uma devota da bandeira.
Há tempos não dormia tanto. Há tempos não me dedicava à arte de espiar a chuva da janela com tanta devoção. Há tempos não ficava tão calada mordiscando os passos em falso que dei nos últimos muitos anos da minha vida. Há tempos não ficava tão calada dando pinceladas de tinta colorida em todo o modelo de vida que adotei nos últimos poucos anos da minha vida. Há tempos não parava pra pensar que ainda me falta muita vida pra me preocupar com pincéis e passos em falso. Há tempos não ria tanto, e justo agora que não podia rir. Há tempos não me sentia a filhinha da mamãe que merece sopinha fria na cama. E a irmã mais velha que ganha um purê em pleno feriado. Há tempos que há tempo que há tempo que há tempo. E há muito tempo ainda, e provavelmente, muitos retiros. Mas os sisos eu já tirei todos. No próximo, quem sabe, vou ver baleias na Patagônia.
Se eu for ver baleias na Patagônia, eu vou chorar. E chorar foi o único item do roteiro-do-retiro que eu não obedeci. Até tentei assistir uns filmes tristes, mas não rolou. Ah!!! Mas....vendo baleias, tudo muda. Muita frieza não chorar vendo baleias. E, até onde me lembro, não sou lá dessas pessoas que se pode chamar de fria.
É. O atestado com louvor acabou. Agora vou usar os últimos dias de atestado para me encantar com a vida de quem pode sair pela noite durante a semana.
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